Uma fotografia austera que mostra um sopé de montanha no Chile, dessas quaisquer fotografias pitorescas montanha/mar. Um registro sonoro dos estalos do sal sedimentado ao rés dessa montanha. A fotografia acaba desnecessária. O ruído dos estalos do sal são inapreensíveis. Se Marssares não tivesse nos dito, jamais teria a mínima possibilidade de os compreender. Os relatos acabam mais importantes que a ação. Lembrei de um livro com o título sarcástico Art, Lies and Videotapes que trata de trapaças, insuficiências ou desvios em registros de trabalhos performáticos. Mas seria redutivista dizer que haveria um atributo comum a qualquer trabalho que exige a presença em ação intempestiva e assim o definiríamos como performance?
Em uma conversa que tivemos
apontei que era difícil o acesso aos sons produzidos pelos artistas que
justamente trabalham com ruídos, música, etc. O que fica é uma certa imponência
das imagens que o registram, pensa-se na bagunça, no improviso; mas apenas se
pode supor os barulhos que regeriam o comportamento dos presentes. Marssares tem vários trabalhos “performáticos”,
que são interessantes sem sabermos como realmente se deram. Ele mesmo sorri, e
começa um outro relato. Talvez um terceiro nível de possibilidade de apreensão
do ocorrido, do evento.
Tentando não utilizar de
citações. Mas nesse caso se tornou impossível. Sobre o evénement
de Deleuze, o acontecimento, o evento. “Não confundir o acontecimento
(evénement) com sua efetuação espaço-temporal num estado de coisas”. Essa nota mágica justificaria, ou economizaria
muitas discussões sobre o estado de
inapreensão e ambiguidade de trabalhos “sonoros”, mas há um outro problema:
Marssares incrusta os sons em objetos. Objetos, coisas, esculturas que se
repetem em disposições e funções diferentes.
O exemplo é a utilização dos
woofers equilibrados uns sobre os outros que acabam me sugerindo o mesmo jogo
formal das colunas infinitas de Brancusi. Pode parecer forçado, mas dentro de
seus trabalhos é valido. Afinal se eu não contasse pra vocês que os estalos são
de sal queimando num sopé de montanha no Chile, vocês jamais saberiam... e
faria alguma diferença? Continua... próximo capítulo “poéticas da
evanescência”..
Publicado no Folder da I Mostra do Programa de Exposições 2015 do CCSP.
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